29
Out
2018

Ser Fiel, compensa?

29
Out
2018

"Em caso de quebra do período de fidelização, não é líquido que a indemnização devida prescreva num magro prazo de seis meses"


Encontrou uma operadora de telecomunicações com condições mais vantajosas e quer cessar antecipadamente o contrato antes do fim do período de fidelização? Quais os riscos que isso acarreta? O período de fidelização diz respeito a uma condição contratual com a qual o consumidor se compromete a não cancelar o contrato celebrado com a empresa operadora, nem alterar as suas condições, durante determinado período de tempo sob pena de poder ter de suportar determinados encargos. Em contrapartida, esta oferece condições mais vantajosas, sejam descontos na mensalidade, equipamentos mais baratos, oferta do valor da instalação do serviço, entre outras possibilidades.

Porém, a questão com que muitos utentes se têm debatido prende-se com os custos a suportar no caso de cancelamento do serviço antes do fim do período de fidelização, custos esses que devem estar claramente definidos no contrato.

Assim sendo, e considerando ainda o facto de os serviços em causa se tratarem de serviços públicos essenciais, sujeitos ao regime da Lei n.º 23/96, sempre seria de aplicar, no que concerne ao direito de recebimento do preço do serviço prestado por parte da operadora, um prazo prescricional de seis meses.

Numa palavra, terminado o contrato, a operadora tem um prazo de seis meses para cobrar eventuais facturas em dívida por parte do consumidor, sob pena de o direito ao recebimento do preço se extinguir.

E esse prazo aplica-se também à indemnização por quebra do período de fidelização?

Os entendimentos têm sido diametralmente diversos.

Por um lado, alguns acórdãos do Tribunal da Relação de Lisboa têm denotado uma tendência no sentido de que, no silêncio da lei, não pode estender-se a essa indemnização o referido prazo prescricional de seis meses.

Com efeito, a Lei n.º 23/96 apenas estabelece mecanismos destinados a conceder protecção ao utente de serviços públicos essenciais, cujo desiderato é evitar a acumulação de dívidas de fácil contracção, obrigando, por seu turno, os prestadores de serviço a manter uma organização que permita a cobrança do respectivo preço em momento próximo do consumo, o que não seria o caso do crédito emergente do incumprimento de outras obrigações assumidas no contrato, como seja a estipulação de um período de fidelização.

Nem sequer tem sido considerado o argumento de acessoriedade ou dependência entre a obrigação de pagamento do preço e a indemnização por quebra de fidelização, pois mesmo o cliente que tenha pago a totalidade dos serviços prestados pode incorrer na violação da cláusula que o obrigava a permanecer na rede da operadora de telecomunicações por determinado hiato temporal. Assim, à indemnização por quebra do período de fidelização seria aplicável o prazo ordinário de prescrição, a saber 20 anos, estando o consumidor sujeito a uma período maior para cumprimento da obrigação sucedânea de indemnizar.

Por outro lado, há quem reivindique, ainda assim, a aplicabilidade do prazo prescricional de seis meses, de acordo com o artigo 10.º da Lei n.º 23/96.

Pese embora literalmente a norma refira unicamente ao “serviço prestado”, os defensores deste regime advogam que o espírito da mesma inclui os serviços não prestados eventualmente exigíveis antes do prazo por via do incumprimento da cláusula de fidelização.

Aliás, se a intenção da norma é a de tornar inexigível o direito a receber uma prestação fundada numa obrigação contratual principal, não faria sentido ser entendida de modo diferente quanto ao direito a exigir uma prestação fundada numa cláusula acessória, como é o caso da cláusula de fidelização.

Este tem sido o entendimento do Tribunal Arbitral do Consumo, concretamente, o Centro Nacional de Informação e Arbitragem de Conflitos de Consumo, defendendo que não se concebe que a lei procure proteger a posição do utente dos serviços quando o prestador os tenha efectivamente prestado, mas recuse essa protecção quando o prestador nem sequer os chega a prestar. Por conseguinte, computadas ambas as posições, verifica-se que em caso de quebra do período de fidelização, não é líquido que a indemnização devida prescreva num magro prazo de seis meses.

Ou seja, ser fiel, por via das dúvidas, compensa!

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