28
Set
2017

O principio da irredutibilidade da retribuição: Qual o seu alcance?

28
Set
2017

A legislação laboral portuguesa, já desde 1969, prevê um princípio de irredutibilidade da retribuição. Ora, facilmente será de compreender que este princípio ordenador, salvo as excepções previstas, existe por forma à manutenção da segurança, e da certeza jurídica do trabalhador. Previsto o mesmo, nos dias de hoje, no artigo 129.º nº1 alínea d) do Código do Trabalho estabelece a impossibilidade da entidade empregadora, salvo as excepções previstas na lei, de unilateralmente diminuir a retribuição do trabalhador.

À luz do artigo 258.º do Código do Trabalho, a retribuição é a prestação a que o trabalhador tem direito em contrapartida do seu trabalho, compreendendo para o efeito tanto a retribuição base como as prestações regulares e periódicas feitas. Conclui o legislador no referido artigo, com uma presunção iuris tantum, de que será retribuição qualquer prestação do empregador ao trabalhador.

Frequentemente ocorrem situações de retribuição mista, em que para além do salário base, é entregue ao trabalhador a título retributivo uma prestação complementar atinente a contingências especiais de prestação do trabalho (toxicidade, isolamento, penosidade, perigo), por certas situações pessoais do trabalhador, como será o caso das diuturnidades, e até mesmo prestações complementares pelo mérito ou pela produtividade/rendimento. Certamente que estas prestações são complementares, mas serão em todo o caso subsumíveis ao conceito de retribuição tout court.

Atendendo ao explanado, facilmente seria de concluir por um silogismo regular - Toda a retribuição é irredutível/A prestação complementar é uma retribuição/ Logo a prestação complementar é irredutível - que às prestações complementares seria de aplicar o princípio da irredutibilidade. Mas será verdadeiramente assim?

Na sua natureza as prestações complementares assentam em factualidades mais ou menos voláteis, mas que se distinguem da retribuição base pela diferença na sua estabilidade. Enquanto aquela é devida como contrapartida do modo específico do trabalho, esta está directamente correlacionada com a actividade desenvolvida pelo trabalhador, mais concretamente com a força de trabalho por ele oferecido. Não fará, por isto mesmo, sentido comparar os dois tipos de retribuição quanto à razão de ser da possibilidade ou impossibilidade de redução do seu valor. Seria extremista considerar que, alterando-se as condições externas que justificam o pagamento da prestação complementar (p.ex: trabalhador que laborava em horário nocturno e deixa de o fazer), não haja uma redução, ou até mesmo uma supressão da referida prestação suplementar. Será justo dizer que desde que cesse, licitamente, a situação que fundamentou a atribuição de certos complementos salariais, será justo também a redução ou supressão dos mesmos.

Tem sido, para o efeito, este o entendimento maioritário da nossa doutrina e jurisprudência, como vem agora exposto no acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães, de 11 Jul. 2017, Processo 246/14, que na sua decisão vem expor: “Apesar da natureza retributiva que os complementos salariais devidos enquanto contrapartida do modo específico de trabalho (subsídio de turno e trabalho nocturno), não se encontram submetidos ao princípio da irredutibilidade da retribuição, podendo a entidade empregadora suprimi-los quando cesse a situação específica que esteve na base da sua atribuição.”.

Em suma, embora de natureza retributiva, as retribuições complementares não se encontram adstritas ao princípio da irredutibilidade da retribuição, pelo que serão somente devidas enquanto perdurar a razão do seu fundamento, podendo destarte, a entidade empregadora suprimi-las quando cesse a situação específica que esteve na base da sua atribuição.

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