30
Jul
2017

Dura lex sed lex mas não para todos

30
Jul
2017

Não vale a pena negarmos a sua existência, nem tão pouco assobiar para o lado e fazer de conta que não reconhecemos a que instituições pertencem. Claques desportivas, um fenómeno que teve início dos anos 60 do século passado e que veio para ficar.
Quando os adeptos se organizam sob a forma de associação, que tem como objecto o apoio a clubes, associações, ou sociedades desportivas nas competições desportivas, estamos perante claques desportivas. É esta a definição de claques que advém do artigo 3.º da Lei 16/2004 de 11 de Maio, alterada pela Lei 39/2009 de 30 de Julho que regula a matéria de violência no desporto.
O assunto da legalização das claques desportivas está na ordem do dia, uma vez que o comportamento dos adeptos dentro e fora do recinto desportivo pode trazer sérias repercussões, não apenas para os próprios, mas também para a instituição que apoiam. Por esse motivo, há instituições desportivas que negam a existência de claques organizadas, não obstante os seus representantes solicitarem constantemente o apoio dos adeptos, e por diversas vezes, as próprias instituições prestarem auxílio técnico na preparação de coreografias, e nas deslocações dos seus adeptos aos estádios.

Remonta há já alguns anos, o episódio de 18 de Maio de 1996, que resultou na morte de um adepto que se encontrava a assistir a um jogo de futebol e teve o infortúnio de ser atingido por um engenho pirotécnico very light deflagrado por um adepto da equipa adversária. O autor material do crime foi condenado pelo crime de homicídio a título de negligência grosseira, previsto e punível nos termos do artigo 137.º do Código Penal, tendo cumprido uma pena de prisão efectiva de 5 anos. A instituição desportiva que apoiava não foi condenada. No ano de 2008, foi levada a cabo a operação Fair Play que culminou com a condenação de 13 pessoas suspeitas de agressões, roubos, tráfico de armas de fogo e estupefacientes associadas a uma instituição desportiva sem claque devidamente legalizada. Novamente, a instituição desportiva não foi condenada.

De facto, para que uma claque possa actuar ao abrigo da lei portuguesa, torna-se obrigatório o registo dos Grupos Organizados de Adeptos (GOA) junto do IPDJ. Por outro lado, ao abrigo do artigo 18.º da supra referida Lei 16/2004 de 11 de Maio, “aos promotores do espectáculo desportivo é lícito apoiar exclusivamente grupos organizados de adeptos através da concessão de facilidades de utilização ou cedência de instalações, apoio técnico, financeiro ou material, desde que esses grupos estejam constituídos como associações, nos termos gerais de direito, e registados como tal no CNVD”. Porém, “o incumprimento do disposto no presente artigo implica, para o promotor do espectáculo desportivo, […], a impossibilidade de promover qualquer espectáculo desportivo”. Contudo, apesar da legalização dos GOA ser obrigatória há bastantes anos, há clubes que ainda assim continuam em negação da sua existência. Face a esta factualidade, torna-se incompreensível a inércia institucional dos órgãos de fiscalização, uma vez que é de conhecimento público que, instituições desportivas com claques organizadas à margem da lei, concedem facilidades de utilização ou cedência de instalações, bem como apoio técnico e material aos seus adeptos, causando estes, distúrbios de ordem pública.

Recentemente, veio o TRL através do acórdão 965/16.0P5LSB.L1-9, negar provimento ao recurso que condenou o arguido a 3 anos de prisão efectiva, acompanhada de uma pena acessória de proibição de frequência de recintos desportivos pelo período de 7 anos, por este ter deflagrado um engenho pirotécnico (tocha) junto à porta de um estádio. Apesar da condenação, parece-nos que a intervenção judicial ficou aquém do que seria de esperar, uma vez que a instituição desportiva deveria também ter sido punida pelo comportamento do adepto. Mas para que tal facto pudesse ocorrer, a instituição deveria ter as suas claques organizadas devidamente legalizadas, o que não tem, não advindo qualquer consequência por esse facto. É demais evidente que terá de haver intervenção legislativa nesta matéria, por forma a colmatar a necessidade de responsabilização, não apenas do autor material do crime mas também das instituições desportivas, pelo menos a título de comparticipação. É que, não devemos esquecer que o escalar de violência advém, muitas vezes, dos comentários dos dirigentes dos clubes, e que em última ratio, a selvática actuação dos adeptos é agravada por tais cometários.

Por outro lado, o Ministério da Administração Interna tem já uma participação concertada com alguns elementos das claques, por forma a garantir a manutenção da ordem pública nos eventos. Também não podemos esquecer que não estão previstas sanções para a falta de registo dos GOA no IPDJ. Não sendo registados, fica-lhes vedada a atribuição de qualquer tipo de apoio por parte do clube. Em caso de violação desta proibição, o clube é sujeito a contra-ordenação e aplicação de coima, que pode variar entre €2.500,00 e os €250.000,00 podendo também ser determinada a sanção acessória de espectáculos à porta fechada, por um período até 12 jogos, algo nunca ocorrido até à data.

Por último, julgamos que deveria ser considerada uma última medida: banir determinados adeptos dos espectáculos desportivos, impedindo-os de assistirem aos jogos durante um determinado período de tempo, ou em caso de reincidência, de forma definitiva. A ida ao estádio para assistir a um jogo deve ser uma actividade de lazer, em família, um encontro entre amigos e não um evento de terror digno de guerra civil. Bem sabemos que santos da casa não fazem milagres, contudo, à semelhança do que dizia Lavoisier, nada se cria e nada se perde, antes tudo se transforma. Como tal, estamos em crer que novos ventos se avizinham, e neste caso, virão para bem do desporto e da sua integridade.

Atenção, o seu browser está desactualizado.
Para ter uma boa experiência de navegação recomendamos que utilize uma versão actualizada do Chrome, Firefox, Safari, Opera ou Internet Explorer.